quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

ICO

Por Guilherme Piloti

“A câmera visualiza patas de cavalos, que cruzam uma trilha em uma densa floresta. Um menino algemado é carregado por um dos três cavaleiros, que tem seus rostos encobertos por capuzes. Pode-se perceber estranhos chifres saindo da cabeça do garoto, que aparenta não mais do que doze anos. Ninguém fala nada, e os únicos sons que se ouvem são os dos habitantes da floresta, o barulho causado pelo movimento dos cavalos e o zunir do vento que movimenta as folhas das árvores.

O pequeno grupo chega até os portões de uma gigantesca fortaleza, e descem silenciosos por uma trilha levando a criança até o pé de uma montanha onde avistam mar adentro uma imensa estrutura que aparenta ter sido construída séculos atrás. Com o auxilio de um barco, cruzam o mar e penetram na construção, onde depois de uma longa caminhada atingem um enorme salão, circundado com dezenas de urnas.

-O que estamos fazendo é para o bem da aldeia... Diz um dos três homens

Sem entender absolutamente nada, e totalmente assustada, a criança é aprisionada em uma urna que é rapidamente lacrada, e deixada lá para morrer. Para os homens e para toda a sua tribo só a morte do estranho garoto poderá aplacar anos de desgraças que surgiriam caso a profecia acompanhada do sacrifício não se concretizasse.”

Assim começa Ico, uma das maiores obras primas da indústria dos games. Esqueça FPS’s com um milhão de polígonos e quase 2000 personagens na mesma cena, Ico é sufocante exatamente porque você está só, quer dizer, só você e Yorda, a princesa que foi capturada e trancafiada numa cela suspensa numa sala do castelo.

Ico foge das extravagâncias visuais dos jogos comuns, Ico se concentra muito mais na profundidade que os personagens trazem à tela do que nas magias e armas que eles têm. Ico não tem muitas armas, nem música – para falar a verdade somente em raros momentos temos música no jogo – e esqueça magias ou coisas do gênero, a máxima magia é a Yorda abrindo as portas seladas por mágica quando ela se aproxima.


Os inimigos são sempre iguais, com pequenas variações, mas a essência é sempre a mesma, “fumacinhas” negras que surgem de redemoinhos no meio do cenário em momentos aleatórios durante o jogo. E você conta apenas com um pedaço de pau – se você for esperto consegue uma mace, que detona os monstros com 2 golpes - e sua coragem para impedir que eles avancem para cima da Yorda e a levem de volta pro redemoinho, o problema é que de cada redemoinho surgem muitos monstros, e em cada parte do cenário, podem surgir – e surgirão – vários redemoinhos com vários monstros, e você tem que atravessar todo o terreno em pouco tempo, e caminhando, enquanto os monstros voam com ela no ombro, sem falar que o tempo é relativamente curto para que eles a levem para o redemoinho – se isso ocorrer e ela for completamente sugada de volta pro redemoinho, game over – e a Yorda não costuma ser muito sagaz durante todo o jogo.

Sorte que o controle do jogo é perfeito, é muito intuitivo e fácil controlar o pequeno Ico pelos labirintos e jardins do castelo, basta não esquecer de segurar e levar pela mão a nossa amiga Yorda, e tudo correrá tranqüilo nessa parte do jogo.


Agora chega a parte mais impressionante do jogo, a concepção gráfica dele. Falar de toda a fotografia e arte gráfica de Ico sem parecer um fã alucinado e adolescente deslumbrado com o que está vendo, mas, é impossível não se deslumbrar com Ico. Imagine que tudo parece perfeito, as folhas das plantas a árvores, o cabelo dos personagens, a água, a incidência da luz, tudo, tudo mesmo é muito bem trabalhado, inclusive, a interação do cenário é muito boa, tudo reage à Ico. Reflexos reais que são modificados de acordo com a interação da água com o ambiente, pássaros, portas, alavancas, árvores com sombras perfeitamente proporcionais. Enfim, uma experiência magnífica é ver Ico rodando.

A parte sonora também é arrasadora, cada som parece encaixar no jogo de modo perfeito, parece que tudo foi pensado à exaustão para que o jogo fosse a obra que é. Cada efeito sonoro é perfeitamente orquestrado, parece que você está dentro do castelo junto com Ico e Yorda.

Mas o ponto mais alto – e um dos pontos fortes do jogo todo – é o cenário gigantesco e opressor. Cada grande salão do castelo te passa a idéia de solidão e opressão que todo o enredo quer que se sinta. Cada torre gigantesca, cada salão, cada árvore, cada caverna, tudo foi pensado para que esse fosse o cenário mais impressionante que os vídeos-game dessa geração pudessem gerar.
Imagine que você altere algum objeto de uma determinada sala, e depois se distancie bastante desta área. Horas depois se você em uma torre altíssima tem a possibilidade de observar aquela mesma sala, lá estará o objeto modificado da maneira que você deixou. Este tipo de detalhe ajuda bastante na ambientação e somado ao tempo quase imperceptível de transição entre um local e outro, acaba transformando o jogo em uma experiência belíssima.

Ainda temos o inúmeros puzzles durante todo o jogo. Ações como empurrar um carrinho que contém uma corrente que permite alcançar uma plataforma com diversas caixas que quando arremessadas podem servir como escada para a jovem Yorda ou... Escalar até o ponto mais alto de um imenso salão e pular em cima de um gigantesco lustre, que cai devido ao seu peso, criando uma ponte que permite que você possa alcançar o lado oposto de onde você está, e diversas outras coisas são extremamente gratificantes, e te causam uma sensação de prazer, poder e inteligência, dificilmente conseguido por outros games.


O meu único porém para o jogo é o fato de ele ser muito curto, se bem que, pensando melhor, não é que Ico seja curto, é que você depois de jogá-lo não quer mais deixar, quer jogar o tempo todo, o máximo que conseguir.

Ico não inova em nenhum sentido, é um jogo de puzzles, RPG que preza a jogabilidade e a arte gráfica sutil acima de tudo, sem se preocupar com magias e frames por segundo, ou a quantidade de sangue que espirra quando se atira na cabeça dos outros monstros. E por isso mesmo, é uma obra prima, porque é simples, deslumbrantemente simples, e vale cada minuto de jogo, mas já aviso que o sentimento de solidão ao vagar pelo castelo é inevitável.


O amigo Guilherme Piloti escreve no blog Pensamentos Randômicos.
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15 comentários:

Marcus Vinícius Freitas disse...

Texto pra salvar e guardar, mas bah. Valeu Guilherme!

Kamila disse...

Não consigo gostar desse tipo de jogo. Quando o assunto é videogame, só consigo jogar alguma coisa de esportes ou Guitar Hero!

Marcus Vinícius Freitas disse...

Kamila, em breve resenha do GH3 aqui. Fique de olho, hehe. Beijos!

Anônimo disse...

Puxa, sou um zero à esquerda quando o assunto é games... de qualquer forma gostei do texto, hehehe ;-)

Agent Lizzie disse...

A cada dia os games, vão ficando com cara de filmes interativos.

ótimo texto.

Qualquer hora, passa no meu blogger:

myxfics.blogspot.com

Anônimo disse...

Como seu blog está cadastrado na Sociedade de Blogueiros Cinéfilos, vou deixar aqui o link da entrevista que fiz com Heitor Dhalia, caso queira ler. Abraços e desculpa a propagando (risos)

http://www.sobaminhalente.com

Anônimo disse...

Opa. Beleza Marcus Vinícius? Primeira vez aqui no seu blog. Sou do blog Diário de Dois Cinéfilos e nesse retorno à net decidi da uma visitada nos blogs da SBBC, sou membro tmb.

Adorei seu blog viu? Parabéns!!

Variado, interessante, textos bacanas. Confesso que no mundo dos jogos nao sou um grande entendedor, mas curto alguns bem famosos. Esse me pareceu bem interessante, estrateégico e talz. Achi interessante o que escreveu sobre os cenários gigantescos que passam a sensação de opressão. Deve ser muito louco jogar algo desse tipo.

Virei constantemente no seu blog e parabéns mais uma vez.

Tá rolando um prêmio bem bacana la pros melhores de 2007 em várias categorias. Se puder dar uma passada, agradeço.

Abraço!!

Dr Johnny Strangelove disse...

tó com Kamilla
Guitar Hero ruleia ... mas como sou pobre e a minha maquina é ruim pra quequeu ... é no Frets on Fire mesmo
ehehee



mas sobre Ico, eu vi uma matéria sobre esse jogo na Superinteressante elogiando esse incrivel jogo ... se eu tivesse um prei 2 eu iria jogar ... mas tá maus ...
até amigo

Anônimo disse...

Adoro ICO exatamente por essa simplicidade discreta quanto de trata de firulas, mas da trilogia acho Shadow Of The Colossus (o segundo), o melhor até agora. Que venha o terceiro... e que seja para um console que custe menos de 3 mil reais...

Alex Gonçalves disse...

Sou super deslocado quando o assunto é games, ainda que, no passado, eu era super viciado em passatempos do Nitendo e PlayStation. Mas no momento só ando me contentando com as fichas para jogar "The King of Fighters" e "Paciência" no pc, rs.

Kamila disse...

Marcus, eu comprei o GH3. E achei o jogo bem diferente... Foi impressão minha ou você concorda?

Anônimo disse...

Obrigado pelo "pra salvar e guardar" Marcus.

Valeu.

Anônimo disse...

Bah1 cadê os textos de cinema?
rsrsrs sacanagem... é quem não consigo curtir esse mundo dos "jogos".
falow!

Marfil disse...

Não conhecia esse jogo...É lançamento? Me lembra um pouco "Shadow of Colossus"...

Marcus Vinícius disse...

Tá diferente mesmo Kamila, mas o legal que a jogabilidade continua a mesma. Gostei muito do modo versus, ficou bem original.

Felipe, muita calma nessa hora. Força total na sétima arte em breve, hehe.

Marfil, ICO é o precessor de Shadows, que é um jogo mais que espetacular.

Abraços a todos!