La Science des Rêves, Michel Gondry, 105 min., 2006Mais uma vez certeiro. Mais uma vez Michel Gondry acerta a mão em “Sonhando Acordado” ao tratar novamente sobre o amor. Legítimo cinema de autor, aqui todas as suas características maluquices estão presentes. O resultado é uma obra de enorme sensibilidade, originalidade e criatividade.
Stephane é um cara que possui um certo problema: ele oscila entre a realidade e os sonhos. Literalmente sonha acordado. Em certos momentos ele não consegue mais diferenciar quando está acordado ou dormindo. Stephane é um artista, mas tem um trabalho que não gosta muito, pois a liberdade criativa nele é zero. E em seus sonhos povoa Stéphanie, sua meiga vizinha por quem ele começa cada vez mais nutrir um amor. Só que esse amor não é correspondido, uma tragédia clássica tema de infinitas obras em todos os campos artísticos.
Ok, não dá para negar que dá uma sensação de fossa parecida com “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”. Porém aqui o clima é muito mais lúdico, é tudo mais onírico. Cavalos saem voando, existem mares de papel celofane, céus de algodão, mãos ficam gigantes, pode-se sair nadando pelas cidades, o programa que ensina a ‘cozinhar’ os sonhos, tem até uma inusitada perseguição de carros de papelão. O mais interessante é que pouca computação gráfica é usada, a maioria dos efeitos especiais é feita em stop-motion, o que dá um visual diferenciado no filme, um ‘quê’ nostálgico, antigo, charmoso até. Já que se trata de um filme sobre sonhos a idéia é que se viva dentro de um, que passe a sensação de estar dentro de um, pelo menos deve ter sido essa a intenção do diretor e em várias vezes é cumprida com méritos.
Em determinada altura do filme tudo se mistura, sonhos e realidade, à medida que Stephane se apaixona cada vez mais. Talvez o espectador mais desatento careça um pouco de atenção para não se perder nessa mudança de narrativa. Aqui cabe um parênteses para a atuação de Gael García Bernal, excelente ator que toca o barco praticamente sozinho até o fim do filme. As demais atuações também estão muito boas, mas quem se sobressai é o ator mexicano.
É bem possível que a maior marca dos trabalhos do diretor Michel Gondry, ultrapassando até a singular estética visual de seus filmes, seja a sensibilidade. O interessante é que ele conseguiu fazer um filme parecido com “Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças” revisitando o tema proposto, mas ao mesmo tempo único, com suas nuances e singularidades. Um filme bonito, açucarado, que faz com quem assiste coloque um sorriso ou uma lágrima no rosto. Qual dos dois irá depender de como andam os sonhos...
*Postado originalmente no CINEFILIA